quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Do livro ANO NOVO DE SÃO JOÃO - Contos & Crônicas (no prelo)

                                                                  Tarcísio Pereira

LIVRO 7

Não dá para se comparar a década de 70 a nenhuma outra. Foram fatos marcantes que jamais serão esquecidos: a conquista do tricampeonato mundial de futebol pela seleção brasileira de Pelé, Tostão, Rivelino e tantos outros craques imortalizados mais do que quaisquer outros nas conquistas posteriores, em pleno processo de ditadura que vivíamos, nos tempos do governo Médici;  a exploração do planeta Marte pela missão espacial Viking I;  a popularização da televisão em cores, o golpe militar no Chile, liderado pelo general Augusto Pinochet, a derrota dos Estados Unidos, pondo fim à Guerra do Vietnã, a Revolução dos Cravos em Portugal, acabando com o regime militar no país, o começo da Guerra Civil no Líbano e a  Revolução Iraniana. Outros fatos marcantes foram a renúncia de Richard Nixon à presidência dos EUA, após o caso Watergate e a a crise mundial do petróleo, justamente quando o Brasil começava a viver a fase do "Milagre Econômico". No campo da música, o fim da banda de rock Beatles, após tanto sucesso e o surgimento de outras bandas, como as internacionais Deep Purple, Black Sabath, Rolling Stones, Led Zeppelin, Pink Floyd e o despontar de tantos artistas no Brasil, como Gilberto Gil, Roberto Carlos, Caetano Veloso, Elis Regina, João Gilberto, Gal Costa, Tom Jobim, Erasmo Carlos, Rita Lee, Chico Buarque, Clara Nunes, Jair Rodrigues, Jorge Ben Jor, Raul Seixas, Tim Maia, Vinicius de Moraes (ufa!), que até hoje continuam fazendo sucesso, além dos estrangeiros David Bowie, Elton John, John Travolta, Donna Summer, Elvis Presley, Rod Stewart, John Lennon,  Bob Marley... É, não dá para se enumerar todos os fatos relevantes daquela década.
Na nossa província, no campo cultural, além do surgimento de uma infinidade de coisas novas, um fato nos deixa com o peito invadido de saudades: o surgimento da lendária Livro 7, que surgiu em Recife em 1970. A livraria tornou-se, em pouco tempo, um ponto de resistência política e cultural, além de um ótimo local para bate-papos, reuniões de intelectuais, encontro de gente bonita, gente de “cuca legal” e que gostava de livros, de biritas, de conversa, sob o comando do grande comandante, Tarcísio Pereira, onipresente a todos os movimentos, sempre ostentando seu boné de jeans. Foi lá que surgiu o bloco “Nóis sofre mas nóis goza” , troça carnavalesca idealizada em 1973 por um grupo de poetas, pintores e artistas plásticos que brincavam o Carnaval daquele ano no Recife, que é considerada a primeira troça anárquica da capital pernambucana e foi criada em plena ditadura militar, caracterizava-se pela irreverência, descontração e improviso.
Eu era, durante a semana, um freqüentador não muito regular da Livro 7, comparecendo um dia ou outro para paquerar, namorar, bater papo e fazer umas farrinhas leves. Nos finais de semana, porém, havia um motivo especial para minha freqüência aos sábados à tarde, com prolongamento até a madrugada dos domingos, que era a nossa “Banda Suor”. Juntamente com Tony Pereira, Givaldo Repolho, Tito Lívio e Luís, nós usávamos o local para nossos “concertos”, para compor novas músicas e fazer o resto que todo mundo fazia. Flaviola, de vez em quando, dava uma canjinha, tornando-nos ainda mais populares no pedaço. Por lá também aparecida, de vez em quando, o clone de Tony Pereira, o Tony Semente, que não tinha nem resquícios da verve poética e cultural do Tony Pereira.
Mas, como “o que é bom dura pouco”, o sonho acabou. A Livro 7, que foi, por cinco anos consecutivos, considerada a maior do Brasil, pelo Guiness Book, começou a definhar. Aquele espaço efervescente havia se transformado num cubículo, com poucos exemplares de livros, bem menos clientes e uma equipe reduzida de funcionários. Era o começo do fim, que chegou de mansinho e o nosso oásis cultural secou.
De vez em quando encontro Tarcísio e, juntos, relembramos alguns momentos inesquecíveis daquele paraíso. Nesses momentos, a saudade faz o peito doer e os olhos começam a marejar...

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